Pensando a relação cultura e consumo, percebo, uma relação complementar como que um invólucro que assume cada vez mais os comportamentos hedônicos e de superficialidade. Ao olhar os jovens inseridos numa cultura onde a valorização do corpo é glorificada, surge o questionamento sobre a disseminação de ideais narcisistas.
Com o acesso fácil a internet e a globalização, a influência da mídia edema cada vez mais diferentes formas de conduta no que recai no afrouxamento de condutas narcisistas e individualistas. Por sua vez, a massificação da mídia, que teria a tarefa de movimentar teorias éticas e, portanto, de coletividade, constitui enquanto instâncias ao amor à própria imagem e na satisfação imediata dos próprios desejos. O que se encontra em jogo aqui é a racionalidade híbrida de crítica e autonomia que atua na sociedade hoje.
Para se ter uma ideia mais concreta, pensamos por um momento o controle que a mídia faz sobre o indivíduo no que diz respeito ao culto do corpo visando o belo. Vemos propagandas que vendem imagens de pessoas bem sucedidas, com carros novos, com bom emprego em academias, ligados ao produto Light ou Diet e aos exercícios físicos, disseminando a ideia de poder que a beleza proporciona ao indivíduo que o consome ao invés de sua principal ideia de saúde que determina sua cientificidade. Desta forma, surgem tendências exacerbadas aparentes do corpo que, personificam sujeitos que pensam mais em si mesmos acreditando na falsa ideia de poder em que a beleza do corpo assume proibindo-o de qualquer tipo de pensamento abstrato.
O que vemos hoje são máquinas belíssimas de apelação sexual esvaziadas de pensamentos e conteúdos.
Motivado pelas leituras de Adorno e suas análises perante a sociedade, surge em mim o questionamento a respeito de uma relação mais humana entre nós, a visão que se mostra clara em minha mente é o surgimento de patologias geradas pela relação entre o homem e a tecnologia. Minha preocupação é justamente advogar a favor da inefabilidade de relações intersubjetivas e humanas frente a globalização e a cybercultura, especificadamente, o sistema de relacionamento Facebook, não de sua estrutura, mas, sim, do mau uso que fazemos.
Se pararmos pra analisar por um momento a tecnologia, esta transformou-se – na sociedade vigente, instrumento de auto conservação da espécie. No que diz respeito ao facebook, este, ao meu ver, deveria ter sua finalidade de aproximação de relações humanas mediante sua eficácia em relação ao espaço (distância geográfica) e tempo (imediatidade). Contudo, a tentativa de aproximar os seres humanos aparece por detrás de seu véu justamente o contrário. Vemo-nos dependentes de objetos técnicos que facilitam a comunicação entre os sujeitos, mas que distanciam-nos ao depositar tendências emotivas aos objetos técnicos no qual, dentro da linguagem marxista, representa um fetichismo, onde a transição entre uma relação racional com a técnica é de sublimação.
Para se ter uma ideia mais clara sobre a temática em movimento, apoiado por uma perspectiva psicológica, a tecnologia sublimada representa a coisificação do sujeito, pois ao abrir espaço para uma relação virtual, esta – com a falta da interação real com “o outro”, esvazia o sujeito de emoções e sentimentos capazes de unir humanamente e alcançar a emancipação. A virtualidade das relações sedimentou de modo mais profundo o caráter das pessoas. Pois, estamos vivendo numa sociedade isolada e fria deficiente na capacidade de interação, posso ainda determinar de massa solitária, recusando de antemão nas outras pessoas suas emoções antes que as mesmas se instalem. Se nossos sentimentos e emoções são absorvidos por coisas técnicas e virtuais reduzimo-nos a meros objetos e indiferente ao outro. Podemos ainda dizer, se não estou sendo levado por um olhar dramático – de uma síndrome; medo do incomodo que pode causar uma interação, já que por detrás da máquina e do “meu espaço” gera a segurança de se mostrar.
Podemos ainda falar, recorrendo a linguagem psicológica, de uma carência de afirmação da consciência, pois sendo esta levada pelo desejo de exteriorização, necessita de um reconhecimento e afirmação noutra consciência. No invólucro do facebook, vemos indivíduos tentando se afirmar virtualmente noutra consciência, o problema gerado pelo reconhecimento no facebook é a perturbação no sujeito pela busca dos holofotes. O que leva os indivíduos a se satisfazerem a qualquer custo. Não é a atoa que vemos post como “partiu tomar banho” ou ainda “tira foto no espelho pra postar no facebook”. Não estou aqui recuando minhas ações perante o face. Alego desde já que me manifestei desta forma pelo face. Mas, é visível em certas postagens – desnecessária – diga-se de passagem, a vontade perturbada de notabilidade. Vejo que o mau uso do face esta criando certas “patologias” desumanizando ainda mais os indivíduos.
Vejo
pelo face um emaranhado de recados com o tema amor. O que me preocupa muito,
principalmente quando vejo frases de filósofos que discutem sobre o assunto, é
a visão distorcida que muitos têm a respeito. Ao pensar a relação amor e
indivíduo, não podemos descartar alguns comportamentos e psiques condicionados pela
sociedade vigente.
Influenciado pelas leituras de Marx e um
artigo de Renato Nunes “O Desafio de Amar”,
surge o questionamento sobre a possibilidade de uma relação duradoura que
muitos procuram, mas não encontram e, não vejo outra saída se não pensar uma
ética de relações intersubjetivas opostas às categorias do capitalismo,
constituída enquanto instâncias de alteridade e afetividade.
Para
se ter uma ideia mais clara, analisemos por um instante sob uma perspectiva
ontológica a intersubjetividade. Eros, desejo que leva o indivíduo a sair de
seu estado egocêntrico, necessita do estado de alteridade para que o ego abra
espaço para realização do encontro do outro e procurar o prazer no objeto
desejado, contudo, este desejo não é uma mera vontade de posse e, portanto, um
apropriar-se de coisas, mas sim, um alcance de reconhecimento de si no e do
outro, o que leva a afirmação de existência do ego. Portanto, amar é a extensão
entre dois corpos no reconhecimento de duas consciências que buscam a
construção da identidade, o que não está desvinculada da intersubjetividade e
que se funda na reciprocidade.
O que se encontra em causa aqui é justamente o
fenômeno da alteridade. A sociedade vigente que se ergue diante do ideal
capitalista cria um abismo entre alteridade e o indivíduo. O reducionismo e
abstracionismo em que as reflexões capitalistas se enredam isolam completamente
da essência do ser humano o “sair de si e olhar para o outro” do ego. Na
sociedade vigente, o fio condutor que mantém as relações é a produção de
mercadorias e a geração de lucro, com isso cria-se o fenômeno que Marx chama de
“fetichismo da mercadoria”, que se estende até às relações humanas. Assim como
as mercadorias representam “poderes alquímicos” - a satisfação que advoga a
favor dos comportamentos hedonistas perniciosos, também ocorre entre os seres
humanos. O que afrouxa a perduração de relações humanas. Seres humanos,
impulsionados pelo desejo egocêntrico, sublimam seus interesses na satisfação
imediata que as mercadorias oferecem, por conseguinte, as relações humanas são
travestidas por este desejo individualista. Os indivíduos buscam no outro a
satisfação imediata de seus desejos, quando isto não ocorre, o outro é
descartado, assim como as mercadorias de consumo, afirmando cada vez mais na
essência do ser o egocentrismo que se opõe a autorrealização e na afirmação da
desubstancialidade deste, prejudicando a própria construção do ego, já que este
necessita do “olhar do outro” para apreender-se.
A
inefabilidade desta essência enquanto algo ontologicamente construído em
atitudes voltadas para si mesmo, esvazia o ser de qualquer explicação positiva
quanto ao sentido de alteridade que engaja o ser humano e concretiza sua
existência, as atitudes hedonistas se tornou um imperativo da psique, o que
leva as relações tornar-se cada vez mais ternas e frívolas.
O que esta em jogo aqui é a necessidade do ego
sair de si mesmo em que as categorias capitalistas não estimulam. A existência
de relações duradouras é inerente à ética. O compromisso está vinculado ao
outro, não que isto exija a metrificação de uma relação. A relação duradoura
deve abrir-se no quiasma da espontaneidade e alegria, e não em um formalismo
contratual. Em outras palavras, o amor genuíno é vivido e contaminado da
verdade do outro. Para seres humanos estabelecer-se no amor genuíno seria
necessário pensar uma ética distinta da atual impregnada de reflexões
hedonistas.
Como
diz Pierre Lévi: “Quem não se ama usa os outros para preencher as próprias
deficiências. Busca um ego complementar ao seu”.
A modernidade, que tem seu marco com entrada da tecnologia, trouxe
ao ser humano facilidades materiais que auxiliaram no progresso científico e
sócio-político. Contudo, ao indagar a valorização desta racionalidade, surge o
questionamento sobre o progresso da humanidade. Ora, se o conceito de progresso
implica a inerência de um desenvolvimento como fio condutor ao avanço
(diante), é possível pensar numa determinação aquém da libertação de mitos que cercam a
espiritualidade (razão e consciência)? A humanidade produz tecnologia para
atender suas necessidades e traz com ela o poderio sobre a natureza que coloca
o homem numa posição historicamente polêmica.
O conhecimento humano quebrou os paradigmas de uma cultura carregada de
dialética religiosa que, até então, destinava o homem a inferioridade.
A ciência rasga a cada momento o véu do mundo libertando o homem das leis
naturais e, mostrando sua autonomia e interferência sobre o percurso desta, principalmente quando se
trata da engenharia genética. Mas, ao resgatar uma ciência, como a ética, que
coloca o comportamento do homem como objeto, esta parece criar um abismo a
qualquer tipo de racionalidade. Do que adianta o homem criar asfalto retirado
da queima do petróleo para facilitar o tráfego de Rolls-Royce se
não podemos trafegar com tranquilidade e liberdade sem riscos de violência? Para se ter uma ideia mais clara sobre o que se encontra em causa aqui,
examinemos por um momento a relação de intersubjetividade. Observamos várias
teorias de relações humanas que frente a prática parece cair num reducionismo,
pois suas reflexões enredam os resultados à inevitáveis tautologias. Toda
racionalidade humanitária, ao recorrer sobre seus projetos, determinam o
indivíduo pelos princípios de razão, vontade e liberdade. Mas, os fatos
demonstram a inefabilidade desta racionalidade, pois ao colocar a essência do
homem enquanto algo ontologicamente racional e livre, configura-se num sentido
travestido que proíbe qualquer explicação positiva, já que a realidade
demonstra uma “relação humanitária” autoritária que impõe à esta mesma essência
uma determinação coisificada e que, portanto, trata o homem como um objeto
inerte.
Vemos a ciência conquistar a revolução, através da tecnologia, como produção em
massa de alimentos; vemos, também, a engenharia genética, graças ao pensamento
humano, produzir alimentos geneticamente modificados que suportam ao ataque de
pragas. No entanto, ainda vemos pessoas morrerem de fome.
Podemos falar realmente de progresso e evolução, se os valores humanitários
perderem-se diante da valorização do saber técnico? Este último, não deveria
trazer a facilidade e com isto a felicidade fundamental pra vida humana?
Esta é a lógica do tecnicismo que tanto celebramos com aplausos.
Tendo em vista o capitalismo adotado como forma econômica para satisfazer as necessidades e assegurar as condições de existência humana, deparamos com o reducionismo das relações sociais figuradas em relações de produção. Isto configura a estrutura da sociedade apoiada na racionalidade de acúmulo de capital. Ora, no que diz respeito ao contraste técnico das indústrias, sua forma padronizada de produção dispersa formas direcionais de organização e planejamento implicando nas formas universais de interesses de consumo. A lógica do sistema torna-se cada vez mais coercitiva conquistando um poder de dominação sobre a sociedade tomando um caráter compulsivo e doentio.
Contaminando toda vida prática humana, a lógica manipuladora do sistema atinge também o campo cultural, infectando toda forma de manifestações e tendências culturais da sociedade, principalmente a música. Mas qual é a causa desta epidemia? Karl Marx já mostrava em seus estudos a origem das classes sociais na medida em que o surgimento de um excedente da produção permitiu a divisão do trabalho através da apropriação das condições de produção por parte de alguns membros, possibilitando, consequentemente, a apropriação privada das condições de produção dividindo os indivíduos em classes de trabalhadores e proprietários desta, vulgo operários e burguesia. Assim também se dá no campo musical, os donos das produtoras e gravadoras adotam a lógica deste sistema e modela-o à seus ideais capitalistas e aplica-o sobre a forma de trabalho acerca do mundo da música. Estes, dominados pela figura de autoridade e pelo sentimento de prepotência e pedantismo enchem suas bocas de “verdades” dizendo sucessores da expansão massificada da cultura musical ao público de forma eficiente e fugaz. Mas na verdade, o fato de que milhões de pessoas participam direta ou indiretamente deste sistema leva aos donos das gravadoras, empresários e os chamados caçadores de talentos disseminarem os bens musicais no esquema de padronização atingindo os modos de satisfação das necessidades dos membros da comunidade. Esta lógica coercitiva apresenta resultados positivos perante a carência dos consumidores, o que permite sua ação de dominação travestida em liberdade sem resistência que, com efeito, explica a unificação do sistema. No que concerne ao método, antes de ser composta, a música perpassa pelo filtro inexorável das categorias pré-estabelecidas pelos donos do comércio de gravação. Para que o compositor possa tornar seu trabalho público é preciso que siga os mecanismos de curto tempo, ou seja, sua música deve ser adequada ao tempo curto de mais ou menos cinco minutos, este tempo é ideal para divulgação nos meios de comunicação principalmente nas rádios que seguem requisitos publicitários. Seguem também, técnicas de arranjos tonais que compõem músicas de acordes perfeitos que não tendem para nenhum movimento dissonante e, suas subdivisões de linhas e refrões que - pela barbárie de sua estrutura letradal, isto é, pelas letras de sentidos superficiais; unidas ao conjunto de versos repetidos em intervalos regulares – permitem com que o ouvinte se identifique com mais facilidade à música proposta. Daí podemos inferir a fácil aceitação dos “estilos” deploráveis como sertanejo, axé, funk,etc..
O próprio juízo estético do gosto que poderia fundamentar o que é bom debilitar-se-ou. Encontramo-nos cercado de músicas padronizadas que não conseguimos julgar com liberdade e com bases qualificadas já que tudo o que nos são apresentados são idênticos, o que nos sobra é a predileção de detalhes bibliográficos e de timbre vocal. A música perde, neste sentido, seu estatuto valorativo, não se julga mediante categorias em si, mas, sim, segundo discografias de moda e pela característica peculiar de acústica da voz, todavia, ambas as categorias são extrínseca à música. Convertemos o valor de bom gosto da música ao sujeito executor; ocorre aqui o fenômeno do fetiche musical. As reações do público ouvinte desvinculam-se da obra de arte e dirigem-se diretamente ao sucesso acumulado que não pode ser justificado pela espontânea audição, mas, sim, pelo comando dos editores de gravação e dos senhores dos meios de comunicação. Vivemos sobre a forma de vida burguesa.
As leis formais que compõem a música contemporânea sucumbem contra a liberdade e subjetividade na era do capitalismo, até aqueles que defendiam a causa, a saber, os compositores; advogam a favor do esquema autoritário transformando-se em testemunhas do sucesso comercial que alienam e coisificam toda a esfera musical. Mas como pensar neste processo que afasta o ser humano da real natureza, ou seja, de sua consciência e pensar abstratamente num juízo de valor estético – a ponto de se tornar estranha a si mesmo e perder o controle de sua própria atividade? A música contemporânea, como vimos, é afetada pela mudança de valor, isto acontece em virtude da nova racionalidade, a saber, proporcionar entretenimento recusando os valores que concede seu estatuto. A música capitalista preenche as lacunas abertas pelo cansaço de escravos em exigências das atividades industriais. A vida capitalista cria um abismo entre o pensamento crítico e reflexivo sobre estética e o público ouvinte. O prazer que a música de entretenimento causa desobriga o ouvinte de pensar, não há necessidade de uma exigência capaz de julgar as convenções impostas sobre o comércio musical, não só pela conversão de seu valor, mas, outrossim, pelas forças do indivíduo esgotadas pelo trabalho. No que concerne o trabalho exercido no sistema capitalista, a natureza do espírito que reconhece e infere conceitos no tempo; a subjetividade, é travestida pelo mecanismo objetivo oferecido por ele (trabalho) que passa a fazer parte do conjunto estrutural do indivíduo, aliás, ao contrário, o indivíduo passa a fazer parte corporal do processo de produção. Este já não tem espaço para sua consciência ficando um oco que é preenchido pelos momentos parciais que servem como entretenimento retirando toda a sua liberdade e alienando sua consciência. O embotar do espírito acontece porque a diversão escapa a qualquer esforço do trabalho mecanicista tardio do capitalismo, pelo contrário, ela renova as forças do trabalhador que lança à mão o entretenimento parase pôr de novo em condições de enfrentá-lo, a tal ponto de tornar esta racionalidade uma forma de consciência, ou seja, uma convicção de satisfação que identifica-se como forma de lazer e felicidade. Este fascínio provocado pela música da moda; sua banalização, se estendeu a toda sociedade modificando sua finalidade. A barbárie cínica atinge a figura de ideologia de originalidade. A ilusória convicção da superioridade da música capitalista tem como fundamento a passividade das massas que, em busca de prazer e lazer coloca o consumo da música em oposição às verdadeiras necessidades de quem as consomem.Todavia, o fetichismo musical não se estabelece somente por meios psicológicos, os novos valores depositados na função da música capitalista evidenciam o aspecto de produto (mercadoria) que norteia o novo sentido da música. Para que o consumidor possa ter acesso a obra de arte é necessário comprar o instrumento de mídia, como por exemplo, cds e dvds, para ouvir o seu trabalho. O que transparece aqui é a perda de mais um requisito do estatuto da música.
Este é mais um dos segredos do sucesso marcado pela lógica dominante das indústrias de música. O consumidor não só busca o prazer que a obra de arte oferece mas, igualmente, idolatra o dinheiro que gastou na mercadoria para ouvir tal cantor da moda, ou seja, o consumidor que manufaturou o sucesso; ele coisifica e aceita como critério objetivo, não porque o CD realmente lhe agradou, mas por ter comprado. Este novo caráter fetichista encontra-se no valor de troca que cria a aparência do imediato. Esta modificação da função da música atinge os próprios fundamentos da relação entre a arte e a sociedade. O aparecimento do valor de troca nas mercadorias assumiu uma função específica de coerção. A necessidade imposta pelas leis do mercado conduz à manipulação da estética e do juízo do gosto e à aparência individual da cultura, isto aumenta proporcionalmente na medida em que cresce o processo de alienação do indivíduo. Destarte, encontramo-nos numa era decadente de produção musical, isto não só explica o fato de estilos musicais já mencionados como sertanejo, axé, funk, dentre outros – fazerem tanto sucesso em nossa cultura, como, também, explica a regressão de nossa audição e de nossas inferências estéticas. É graças ao nosso “bom gosto” que compositores como Latino encontra-se nos topos das obras mais vendidas, ademais, sem esquecer que estará representando a cultura de nossa sociedade. Enquanto a cultura estiver sob à luz da racionalidade capitalista, nossos ouvidos se configurarão sob forma de vaso sanitário enchendo-se de fezes cada vez mais fétidas e aqueles que se comprazem com os juízos estéticos irracionais da era capitalista é tão pérfido quanto os provedores desta vergonha.
A relação entre pontos traumáticos e o "sujeito transcendental", é para a psicanálise uma relação determinante para o processo de superação e maturação do sujeito. Mas, devido algumas experiências e algumas leituras de Freud e Herbert Marcuse, fez surgir por meio de um insight o questionamento sobre a possiblidade do rechaçamento dos traumas já que este parece-me a tarefa última da psicanálise. E, tentarei explicar aqui a oposição a este modelo constituído pela psicologia, advogando a favor de que a psicanálise, enquanto seu fim último, a saber, a pulverização das lesões - se frustra.
No interior da psicanálise, sua tarefa parece constituir-se na tentativa de pensar o sujeito psicológico e os traumas numa relação que tem por objetivo uma racionalidade antitética. Trata-se de reavaliar, por meio de introspecção, a dialética histórica dos contéudos idênticos do sujeito na tentativa de resgatar e trazer ao momento presente na consciência as lesões apresentadas nesta história mantidas neutras no inconsciente e que representaria a lacuna na formação do superego, para que nesta espécie de iluminação momentânea das lesões, que se colocam a frente, sejam posta no filtro do movimento de expurgação, há uma manobra feita para o rechaçamanto das lesões afim de que haja o instante de superação deste sujeito. Mas, ao que parce este momento da dialética antitética não acontece.
Para se ter uma idéia mais clara do problema proposto é preciso pensar por um momento o caráter ontológico do sujeito, tanto no contexto da libertação das lesões enclausuradas no inconsciente, quanto na reflexão para a superação. Ao tentar isolar os conteúdos históricos que criam um abismo na construção idêntica do sujeito trazendo-os à consciência para que, esta faça o trabalho de expurgação, a tarefa apresenta sua inefabilidade na configuração ontológica, pois apresenta o oco que proíbe a purificação das lesões. Este é exatamento o problema apontado à Psicanálise. O conteúdo traumático dispensado no discurso superativo da psicanálise, não atinge seu ponto abstrato o que torna uma pretensão encantatória da Psicanálise que performa o rechaçamento.
O que esta em jogo aqui e justamento o rechaçamento, pois não há a manobra feita para retirar do sujeito psicológico os traumas. No momento em que o sujeito torna consciente seus pontos traumáticos afim de superá-los ele passa a direcionar todas essas lesões como fundamento dominante de suas ações futuras. Um dos frutos para que a superação aconteça; as lesões devem aparecer justificando as novas ações e impedindo ações não-padronizadas que tinham como causa os traumas. A figura de expurgação e, portanto, da negação das lesões sobre a qual a tarefa da psicanálise conduz, dá um sentido frustrado enquanto seu fim último que se apoia no recurso da dialética antitética que opera como construção do sujeito matando os traumas.
A proposta aqui se apresenta, baseada no pensamento de que os traumas e lesões não morrem, sendo estes materias que se põem resistindo - como uma outra linguagem da psicanálise que coloca o caráter afirmativo das lesões como nova função no confronto com a superação que não acaba na irrupção destes materiais.
A busca pelo ingresso no mercado de trabalho que dê conta da realidade em que não só eu, mas várias outras pessoas estão inseridas, passou a ser minha preocupação. Analisando no interior das minhas relações sociais e, apesar de adentrar o campo da particularidade, percebo que em função de um direito legítimo do desenvolvimento humano e, conseqüentemente, de suas aptidões, a forma de vida econômica vigente – adotada pela sociedade, não dá espaço para uma relação social humanitária onde a natureza humana poderia ser desenvolvida num processo emancipatório. Deste modo, a atividade humana e, portanto, existencial, se constitui enquanto relações objetivas entre coisas e não mais relações pessoais entre homens.
Recorrendo aos pensamentos de Karl Marx e de Herbert Marcuse, para pensar os procedimentos da vida econômica da sociedade vigente, busco no interior destes métodos entender a sua legitimidade e seu controle sobre a natureza humana. Se voltarmos os olhos para a história da humanidade iremos perceber que o germe destrutivo de toda liberdade e satisfação do homem em suas atividade encontra-se no papel de dominação. Com efeito, a dominação que abre espaço para a relação senhor-escravo entre os homens vem sendo o locus para a repressão e subjugação efetivas das aptidões humanas. Herbert Marcusejá pensa numa interpretação filosófica do pensamento de Freud, a saber, processo dinâmico de civilização – onde a auto-repressão do sujeito reprimido se instala em sua psique e que dá sustentação para a existência de senhores e instituições cada vez mais privadas. Deste modo, a exploração de mão de obra acaba também se efetivando.
No que diz respeito ao capitalismo tardio, seu procedimento apresenta como objeto a mercadoria e sua concepção finalística o lucro. Acontece que no interior da produção de mercadoria o trabalhador vende sua mão de obra para a criar produtos transformados em propriedades do empresário mediante contrato e, conseqüentemente, o poder do capital também nas mão deste segundocolocando o primeiro (trabalhador) numa posição limitada na apropriação do produto que ele mesmo produz. Com o capital no controle do empresário, este também tem o domínio da mão de obra que sendo ela comprada é travestida também em mercadoria de pouco valor tendo como objeto de comparação o lucro gerado pela quantia de mercadoria produzida pelo trabalhador. A crítica aqui levantada é a perspectiva do pensamento econômico que ocorre na divisão de trabalho, performando a racionalidade da sociedade. O que se questiona é a redução e abstração que a forma de vida econômica resulta o sujeito. Esta esvazia o trabalhador de seus conteúdos humanos. E o que se encontra em causa neste momento é como o trabalhador entra em conformidade com estas leis? E como pode o trabalhador, sendo ele o mais prejudicado, sustentar as categorias do capitalismo?
Sendo a atividade humana um meio para o desenvolvimento da humanidade, a relação social frente o capitalismo determina a natureza e a existência da humanidade. Em outras palavras: a mercadoria que deveria assumir o papel à serviço das necessidades do homem passa a dominar toda forma de vida do ser humano. A consciência que é uma das aptidões do homem e uma das fontes para o desenvolvimento e emancipação fica a mercê das relações materiais de produção. Neste caso, o trabalho que deveria ser o meio de auto-realização acaba sendo reduzido como objeto de repressão. Já que o trabalho determina a existência do sujeito que é objetivado pela sua mão de obra, esta torna-se uma propriedade daquele que consegue pagar por ela. A lógica que compreende o sistema capitalista retira do trabalhador sua própria existência, as atividades que compreende a sociedade já não dão espaço para a satisfação necessária do trabalhador. Em outros termos: o trabalho deforma as faculdades humanas e seus processos de satisfação. Portanto, o trabalho no qual o sujeito deposita maior parte de sua vida não realiza sua verdadeira forma, já não se pode encontra satisfação e prazer no interior do trabalho, o homem já se contradiz frente às suas atividades sendo reduzido à funções animais, sua liberdade acaba sendo extinguida.
O resultado desta nova relação social que cortina a verdadeira relação pessoal entre homens incorpora uma nova ordem social, a saber, da posse e aquisição. A busca pelo poder do capital é reduzida na soma de riquezas e do acúmulo de mercadorias e, portanto, da propriedade. Os indivíduos passam a assumir uma posição dentro do sistema; o modo de interesses particulares e possessivos expondo o comportamento individualista negando mais uma vez a humanidade e intensificando a pobreza, já que o acúmulo de mercadorias se torna uma atividade de poucos. O problema levantado aqui que passa a ser o termo-chave para este discurso é o esvaziamento do ser e o quanto a lógica do capitalismo tardio bestifica toda humanidade. Um sistema desenvolvido para satisfazer as necessidades do homem acaba por retirar-lhe sua natureza. O processo de civilização parece, na verdade, uma regressão à barbárie.